sábado, 9 de fevereiro de 2008

"OS ESTADOS UNIDOS E ISRAEL QUEREM CRIAR DIVISÕES ENTRE OS LIBANESES"


Bonnet é um dos maiores especialistas em segurança da França. Foto: Al-Intiqad


Por que toda esta preocupação internacional com o Líbano?

Há três países que querem se intrometer nos assuntos do Líbano. Primeiro, os Estados Unidos, e depois a Arábia Saudita e Israel. Há uma convergência grande de interesses e de cooperação entre os sauditas e os israelenses no Líbano. Esta cooperação saudita-israelense ocorre por meio do pessoal de David Welch (secretário adjunto de Estado para Assuntos do Oriente Médio dos Estados Unidos), em Beirute. Já os Estados Unidos querem transformar o Líbano em uma base para fazer pressão sobre a Síria e o Hezbollah.

A quem o senhor se refere como o pessoal de Welch?

Me refiro ao quarteto Samir Geagea (líder do grupo pró-Israel, Forças Libanesas), Walid Jumblat (líder druso do Partido Progressista Socialista), Saad Hariri e Fuad Siniora (ambos do Movimento Mustaqbal). Todas estas pessoas são totalmente submissas as ordens de David Welch

Por que o senhor se refere desta forma a estes políticos?

Veja a realidade libanesa hoje. Há uma divisão interna profunda, cuja principal consequência é o enfraquecimento dos cristões que é bem vísivel por causa da incapacidade deles de escolher o presidente da república sem o aval de Washington, da Arábia Saudita e de Israel. Na visita que fiz ao Líbano, me surpreendi com o tamanho da divisão interna resultante da interferência externa. Todos querem impor sua vontade sobre os libaneses, começando pelo nosso ministro das Relações Exteriores (Bernard Kouchner) que pediu abertamente para o exército libanês destruir o campo de refugiadios palestinos de Naher Al-Bared. Tenho certeza de que se tívessemos deixado os libaneses cuidarem de seus assuntos sozinhos, eles já teriam chegado ao governo de união nacional.

Na sua opinião, qual é a parte que está impedidno a formação de um governo de união nacional no Líbano?

Os Estados Unidos e Israel. A pergunta que devemos fazer é para o interesse de quem está ocorrendo todos estes crimes? A resposta óbvia é a de que a divisão política no Líbano serve aos interesses de Israel, em primeiro lugar. Quando visitei o Líbano em agosto de 2006, o Líbano passava por uma situação de unidade nacional representada pela postura do Michel Aoun (líder do Movimento Patriótico Livre) e a do Sayed Hassan Nasrallah (secretário-geral do Hezbollah). Nasrallah foi bastante inteligente ao considerar a vitória obtida pelo Hezbollah como uma vitória de todos os libaneses, ao mesmo tempo que Michel Aoun ficou ao lado do Hezbollah durante a guerra. Os Estados Unidos e Israel querem criar divisões entre os libaneses obstruindo qualquer tentativa de solução da crise.

Por que o exércio libanês teve que lutar em Naher Al-Bared?

Os Estados Unidos possuem à vontade de voltar ao Líbano militarmente. Como o sul do Líbano é uma região de forte influência do Hezbollah, os norte-americanos viram que a melhor forma é entrar pela porta do norte libanês ressuscitando o antigo projeto de construir uma base militar nesta área do Líbano. Para alcançar este objetivo, surgiu a idéia na cabeça de alguns nos Estados Unidos de criar incidentes e problemas para justificar a entrada e a presença militar na região. É importante saber que este grupo "Fatah Al-Islam" era financiado pela família Hariri, onde o salário pago a cada índividuo deste grupo chegou a US$ 700. Esta informação é indiscutível. O exército caiu em uma grande armadilha que foi armada contra ele e acabou sendo arrastado para este enfrentamento sagrento que poderia ter sido evitado. Quando eu vi o sr Kouchner se comportando como um general militar pedindo pela destruição de Naher Al-Bared, eu vi o tamanho da irresponsabilidade de como foi tratada este questão.

Quem está por trás destes assassinatos?

Para responder é preciso voltarmos a aquela pergunta anterior: para o interesse de quem está ocorrendo estes crimes? Como se pode culpar a Síria rotineiramente, uma vez que os sírios sabem bem que eles estão na berlinda? Eu, particularmente, acredito que a Síria muito longe de todos estes assassinatos.

Quem matou o capitão Wissam Aid (oficial do serviço de segurança libanês morto recentemente) na sua opinião?

Este assassinato foi praticado por pessoas próximas da vítima que trabalhavam ao seu redor. Não é importante saber quem executou o assassinato, mas saber quem orienta e comanda o assassino.

Por que todos estes assassinatos?

Estes assassinatos todos têm o objetivo de manter a continuidade da crise e suas complicações. Estes assassinatos não objetivam pessoas tanto quanto visam uma escalada na tensão. É só nos perguntarmos no caso do assassinato de Pierre Gemael, qual era o grau de incômodo que ele representava para os que o assassinaram e veremos que, na verdade, ele não incomodava nada. Estes assassinatos têm o objetivo de deixar o pavio da crise aceso.

Na sua opinião, por que Samir Geagea se sente tão forte e tranquilo?

A única explicação para isso é que ele está do lado de quem executa estes assassinatos.

O Jumblat sempre acusa o Hezbollah por estes assassinatos?

Se for verdade, então que mostre suas provas. Jumblat esquece que ele tem uma participação grande nestas questões dos assassinatos. Com certeza para todos, o Hezbollah não tem nenhuma relação com todos estes assassinatos. Pelo contrário, estes assassinatos só servem aos interesses dos inimigos do Hezbollah.

Tudo o que o senhor disse até agora é baseado em informações concretas ou em análises?

Os dois juntos.

Se estes assassinatos tivessem ocorrido na França, eles teriam sido desvendados?

Sim. Eles teriam sido descobertos

Por que eles não são desvendados no Líbano?

Porque no Líbano não se investiga direito. Aproveito para dizer que descobrir quem matou o Rafic Hariri (ex-primeiro-ministro) está entre as coisas impossíveis.

Por que?

Porque os investigadores atrasaram muito. Você não concorda que depois de três ou quatro anos é um tempo muito longo. Tecnicamente, tinha que ser colhidas provas imediatamente, ou sejam nas primeiras horas e nos primeiros dias.

Eles dizem que possuem provas?

Então, mostrem onde estão estas provas. Por que eles não mostraram as provas que dizem possuir.

Eles dizem que é para mostar somente no tribunal internacional. O que acha?

Como você pode acreditar que é possível esconder provas desta importância este tempo todo com a existência de sistemas de comunicação e informação grande em todo o mundo?

Eles vão acusar os quatro oficiais que estão detidos?

Eles não possuem qualquer prova. Tudo o que eles dizem são acusações vazias e suposições.

Dizem que a divergência do Hariri com o presidente Emil Lahoud, que era próximo da Síria, resultou no assassinato do Hariri. O senhor acredita nisso?

Lahoud é um homem sincero que tentou salvar o máximo que podia salvar. Acredito que o futuro vai descrevê-lo de uma maneira melhor do que hoje. Lahoud se chocou com os peixes grandes dos empresários e do dinheiro e tentou evitar que eles controlassem o Líbano. Lahoud fez o que foi possível ser feito.

Como o senhor avalia o entendimento entre o Hezbollah e o Movimento Patriota Livre?

Primeiro, é necessário apontar a moderação e a grande tranquilidade que caracterizam o caráter do Sayed Hassan Nasrallah, que é uma pessoa muito inteligente. O general Michel Aoun, trabalhou por meio deste entendimento afastar qualquer perigo de uma nova guerra civil, além de se esforçar seriamente para preservar a presença cristã no Líbano por meio desta aliança com o Hezbollah. O Hezbollah é um apoio forte que tranquiliza os cristãos quanto ao importante papel deles no Líbano e no Oriente Médio.

O senhor quer dizer que Aoun age para salvar os cristãos libaneses por meio deste entendimento?

Se eu fosse um cristão libanês, eu me aliançava com Michel Aoun e apoiava sua política. Você acha que os cristãos do Líbano que são minoria no mundo árabe possuem condições de viver com os salafitas (ideologia da Al-Qaeda). O pessoal do Hezbollah é moderado. Qualquer um que acompanha os acontecimentos no Líbano e no mundo árabe sabe disso.

Há motivos para se ter medo da presença cristã no Líbano?

Os cristãos desempenham seu papel no Líbano e no mundo árabe uma vez que eles são parte desta região. Volto a repetir que o entendimento Aoun-Nasrallah vem ao encontro dos interesses dos cristãos e sua existência. Eles formam uma entidade reconhecida há anos nesta região.

Como o senhor avalia a política da França no Líbano?

A política francesa necessita de "compaixão" desde os momentos finais do mandato do presidente Jacques Chirac que confundia seu bolso com os interesses da França. No que diz respeito ao presidente Nichola Sarkozy, com ele não se repete as questões pessoais como era com Chirac, porém Sarkozy está longe de se comparar com Charles de Gaulle. Sarkozy é próximo dos norte-americanos. Já o ministro das Relações Exteriores Bernard Kouchner se comporta conforme os seus princípios. Nas questões relacionadas ao Líbano e ao Irã, Kouchner se comporta na maioria das vezes de acordo com os seus sentimentos de judeu e não como francês. Kouchner foi uma das vozes na França que apoiou a invasão norte-americana no Iraque.

O senhor vê o Hezbollah como um grupo moderado no Líbano. Porém, os veículos de comunicação da França mostram totalmente o contrário. O que acha?

É verdade. É vergonhoso os veículos de comunicação da França mostrarem as coisas desta forma, dizendo que o Líbano está dividido ao meio, representado de um lado por um campo democrático, no caso os que estão no governo, e o outro pelo campo da Síria, formado pela oposição. Eu quero perguntar com base no que a imprensa francesa vê os que estão no governo hoje como mais democráticos dos que os outros que estão na oposição? Quanto a Síria, o que é rídiculo é ver que a maioria dos políticos que estão no governo atual comeram por muito tempo nas mãos dos sírios e hoje eles acusam o Michel Aoun de estar aliado à Síria. Quem foi que levou Aoun a sair do Líbano e se asilar na França? Quanto ao Hezbollah, o Hezbollah de 2008 não é mais o mesmo Hezbollah de 1985 (quando o partido surgiu oficialmente). O Hezbollah é um grupo de resistência contra a ocupação e o Sayed Hassan Nasrallah desempenha no Líbano o mesmo papel que Charles de Gaulle desempenhou na França.

O senhor falou sobre a distorção da realidade na imprensa francesa. Por que toda estas distorções?

Na imprensa francesa há um processo proposital de deturpação, principalmente, no que se refere aos muçulmanos xiitas (maior comunidade religiosa do Líbano da qual fazem parte o Hezbollah e o Movimento Amal, grupos que lideram a oposição). Estas distorções se devem ao lobby que domina a imprensa francesa aliada a uma deficiência jornalística quando se trata da cobertura dos muçulmanos xiitas. Os muçulmanos xiitas devem aparecer mais de forma correta na imprensa francesa. Eu fico chocado com as mentiras que certos grupos libaneses espalham na França sobre os muçulmanos xiitas por meio dos veículos de comunicação.

O senhor publicou um livro sobre a questão nuclear iraniana. O senhor pretende publicar outros livros?

O livro "Nucléaire iranien: Une hypocrise internationale" contém documentos sobre a hipocrisia que comanda os Estados Unidos desde a época do Xá Reza Pahlevi sobre esta questão. Eu pretendo lançar um novo livro sobre os reféns franceses com o título "Réfens das Mentiras" onde vou contar os escândalos de Jacques Chirac que se aproveitou deste assunto na disputa interna pelo Poder com o presidente François Mitterrand. Eu presenciei todo este período por meio do cargo de segurança que ocupava . Pretendo também no futuro escrever um livro sobre os muçulmanos xiitas.

O senhor pretende visitar o Líbano em breve?

Eu sempre visito o Líbano. Tenho uma vontade grande de encontrar o secretário-geral do Hezbollah, Sayed Hassan Nasrallah, porque ele é um homem divino que merece o maior respeito.

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