segunda-feira, 25 de maio de 2009

25 DE MAIO, DIA DA DIGNIDADE

Por Mohammad Shmaysani

O dia 25 de maio é a data em que a dignidade dos árabes foi cravada nas mentes e corações dos homens livres. O dia 25 de maio é a data em que se exorcizaram as sombrias pragas de sucessivas Nakbas (1) (15 de maio) e de acordos vergonhosos (17 de maio) ao longo de 60 anos. O dia 25 de maio é quando a história embarcou numa nova jornada em direção a um futuro rigoroso, mas brilhante, quando a derrota não terá mais lugar.

Chame-o de acontecimento ou conjunto de circunstâncias, o que aconteceu naquele dia foi nada menos que um milagre. O dia 25 de maio de 2000 foi o dia em que o Líbano fez tremer o solo sob os pés dos soldados “invencíveis” do estado sionista, forçando-os a retirar-se da maioria dos territórios ocupados no país.

O que estamos celebrando hoje é o resultado de 22 anos de resistência, persistência popular e esforço para transformar a Causa de Al-Quds (Jerusalém) de um assunto pan-árabe e um tema de dimensão islâmica.

22 anos de luta contra uma força militarmente superior e agressiva, que derrotou exércitos árabes em dias, tem relação direta com a crença sólida e o comprometimento com uma causa justa.

O Hezbollah (2) fez um progresso gradual desde a longa batalha de Khalde (sul de Beirute), em 1982. De uma capacidade inicial modesta, baseada em operações de martírio, a um corpo organizado formado por combatentes altamente treinados, executando operações perfeitamente planejadas, o Hezbollah estava destinado a fazer história.

Perdas significativas nas fileiras israelitas, a destruição das posições do Exército do Sul do Líbano, liderado pelo senhor dos colaboracionistas, Antoine Lahad, e a realização de operações únicas no interior da assim chamada “zona de segurança” não deram ao então primeiro-ministro israelense, Ehud Barak, outra alternativa a não ser estancar as perdas e fugir. Foi a primeira derrota de Israel, que expôs sua fragilidade.

“Israel pode ter armas nucleares e armamento pesado, mas eu juro por Allah Todo-Poderoso, ele é mais fraco que a teia de uma aranha”, declarou o secretário-geral do Hezbollah, Sayyed Hassan Nassrallah, durante o pronunciamento da vitória, em Bint Jbeil, 2000.

A estrela do Hezbollah continuou crescendo à medida que o Partido da Resistência passou a desfrutar de apoio na maior parte do mundo. O mesmo partido que derrotou Israel impôs suas próprias condições para libertar centenas de árabes e libaneses detidos nas prisões israelenses, bem como os restos mortais de dezenas de mártires da Resistência Islâmica.

A maneira como o Hezbollah lidou com os colaboradores durante o processo de liberação deu-lhe o respeito que ele merece.

“Meses após a liberação ter sido conquistada, eu disse ao embaixador francês: transmita minhas saudações ao seu primeiro-ministro e conte-lhe que nossa resistência é mais civilizada e mais ética que a francesa, porque vocês executaram dez mil agentes, alguns dos quais nunca tiveram um julgamento (3), e nós não matamos nem ‘uma galinha’ que pertencesse ao (comandante dos colaboracionistas) Antoine Lahad”, afirmou o secretário-geral do Hezbollah.

Seis anos após a liberação do Líbano, e depois de ter eliminado o presidente palestino Yasser Arafat e acabado com a segunda Intifada, Israel tentou restaurar a sua imagem manchada de “exército invencível”. Um esquema organizado entre os Estados Unidos, Israel e alguns países árabes tentou destruir o Hezbollah de uma vez por todas. Mas, o plano falhou.

“Dias duros de batalha clamaram as vidas de nove soldados, em dois incidentes. Às 5 horas da manhã, dezenas de ‘terroristas’ esperavam as tropas das Forças de Defesa de Israel na entrada da vila de Bint Jbeil”, contava uma reportagem do jornal israelense Yediot Aharonot, no dia 27 de junho de 2006; era o 15º dia da guerra de 33 dias contra o Líbano.

Nesta guerra, os soldados da Resistência Islâmica mataram dezenas de soldados, destruíram dois orgulhos de Israel – os navios Merkava e Saar – e estiveram perto de bombardear Tel Aviv. Israel teve de enfrentar seu segundo choque, desde sua criação.

“A Segunda Guerra do Líbano constituiu uma grande e perigosa oportunidade perdida”. Foi desta maneira que o Comitê Winograd (4) concluiu o relatório de 600 páginas sobre a derrota de Israel no conflito.

“Israel embarcou numa guerra prolongada, que foi iniciada por si mesmo e que terminou sem uma vitória militar clara. Uma organização ‘quase militar’ (sic), somando alguns milhares de combatentes, enfrentou durante algumas semanas o exército mais poderoso do Oriente Médio, um exército que detinha absoluta supremacia aérea e vantagens em tamanho e tecnologia”, relatou o documento.

Não havia nada que pudesse restaurar a imagem manchada de Israel.

O Mossad (5) assassinou o comandante da Resistência Islâmica, Imad Moghnieh, em 2008. Hajj Redwan, como também era conhecido, teve um papel preponderante na dupla derrota de Israel. Seu assassinato e as manobras de larga escala de cinco dias (Ponto de Mudança 3), marcadas para o dia 31 de maio, sugeriam que Israel estava planejando um novo round de confronto.

“A primeira (hipóteste) é dizer que o objetivo prioritário destas manobras tem uma natureza psicológica e moral… A segunda hipótese é que Israel está realmente preocupado com sua existência... A terceira possibilidade – vamos colocá-la no grupo das ações intimidadoras – tem o objetivo de mandar uma mensagem para toda a região – palestinos, Líbano, Síria, os povos e os governos árabes, o Irã e o resto do mundo – que Israel não é fraco, não está quebrado ou hesitante como vocês imaginam... A quarta e última hipótese que nós não podemos ignorar é que Israel está planejando uma nova blitzkrieg (6)”, declarou Sayyed Nassrallah.

No pior cenário, Israel estaria se dirigindo para um novo e, provavelmente, último round.

“Escutem o que Ben Gurion diz. Ele diz que Israel cairá... Sim, cairá… não se retirará do Sul (do Líbano) ou do Golã ou do Sinai ou da Cisjordânia, não. Ele diz que Israel, esta entidade artificial, vai cair depois de perder a sua primeira guerra... e Israel teve sua guerra em julho de 2006. Alguns sionistas chamam-na “a sexta guerra”, assim como a maioria do mundo, mas os líderes estrategistas de Israel chamam-na de “primeira guerra”, declarou Sayyed Nassrallah durante o funeral do mártir Hajj Redwan, em fevereiro de 2008.

Falando religiosamente, os judeus dizem que a primeira “destruição do templo” (7) aconteceu pelas mãos de Nabucodonosor, o rei da Babilônia. A segunda destruição do templo aconteceu pelas mãos do Império Romano. Após as derrotas de maio e julho, muitos judeus ultra-ortodoxos expressaram sua crença de que a terceira destruição prometida do templo estaria por acontecer e com ela o estado de Israel deixaria de existir.

Politicamente falando, a dupla derrota de Israel no Líbano não afetou apenas esta entidade maléfica. Seus maiores apoiadores, os Estados Unidos, também sofreram um revés. Os estadounidenses pensaram que invadindo o Iraque unilaterlamente demonstrariam poder de ameaçar o Irã, a Síria, o Hamas e o Hezbollah, em consonância com o projeto dos Estados Unidos para a região, conhecido como Novo Oriente Médio.

A falência das políticas estadounidenses na região, particularmente sua guerra contra o Iraque, de fato, constitui outro fator da queda de Israel; um fator que nem Ben Gurion tinha em mente, nem os judeus ultra-ortodoxos haviam citado em seus livros.

Zbigniew Brzesinski, ex-conselheiro de segurança nacional dos Estados Unidos, explicou em uma de suas entrevistas após a guerra de 2006 que “as prescrições neoconservadoras, das quais Israel tem seus equivalentes, são fatais para a América e, ultimamente, para Israel.

Eles vão voltar a esmagadora maioria da população do Oriente Médio contra os Estados Unidos. As lições do Iraque falam por si mesmas. Eventualmente, se as políticas neoconservadoras continuarem a ser perseguidas, os Estados Unidos serão expulsos da região e este será o começo do fim de Israel, também”.

Atento à natureza inerentemente agressiva de Israel, Washington, sob o novo presidente Barack Obama, procura uma abordagem diferente na região, particularmente no que diz respeito à Síria e ao Irã.

A abertura dos Estados Unidos à Síria e ao Irã pode ser entendida de duas maneiras contraditórias: Primeiramente, Washington estaria interessado em aliviar sua política para o Oriente Médio, provavelmente por causa de sua inabilidade em gerenciar novas guerras em meio a uma crise econômica que devasta o mundo, inabilidade em expandir seus já exaustos contingentes militares e inabilidade em garantir os seus lucros nos estados do Golfo Arábico, ricos em petróleo.

Em segundo lugar, Washington estaria liderando uma falsa campanha para ganhar tempo, propagando a intenção de manter conversações com a República Islâmica, enquanto sua contraparte, Israel, desenvolve manobras e exercícios em Gibraltar, simulando um ataque aéreo contra instalações nucleares do Irã.

Finalmente, os Estados Unidos temem não ter condições suficientes de convencer a comunidade internacional de sua capacidade em realizar tal ataque após ter, seis anos atrás, diante do Conselho de Segurança da ONU, afirmado que o Iraque possuía armas de destruição em massa, algo provado falso.

Em qualquer caso, Israel parece estar mais do que determinado em atacar o Irã, sabendo que tal ação pode conturbar toda a região. Suicida como parece ser, Israel pode adotar esta opção, mesmo sem o consentimento de Washington.

Não é preciso dizer que é difícil separar o conflito árabe-israelense, especialmente na Palestina ocupada, do pântano em que os Estados Unidos se meteram no Iraque e da questão iraniana. Talvez haja quem engane a si mesmo acreditando que Washington e Tel Aviv têm a capacidade de impor uma solução unilateral talhada para a região. Brzezinski acredita que se uma solução para a Questão Palestina não for encontrada e que se o Irã não se engajar política e diplomaticamente, então chegará o dia em que toda a região explodirá. Israel, de acordo com o político veterano, estaria em grande perigo. (AL MANAR)

NOTAS:

(1) Do árabe “nakba”, que significa “tragédia” (NT).

(2) Hezbollah, em português, significa, literalmente, “Partido de Deus”. Movimento patriótico que surgiu no início da década de 1980 para combater a invasão israelense no Líbano. Hoje, além de manter um exército fortemente treinado e armado, é um partido político com assento no Parlamento libanês e um movimento com ampla ação social no país (NT).

(3)Refere-se, aqui, Sua Eminência, à execução sumária, após a liberação da França, dos colaboracionistas franceses que apoiaram e defenderam o regime nazista, na II Guerra Mundial (NT).

(4) Comitê constituído pelo Knesset – o parlamento da entidade sionista – para investigar as causas da derrota de Israel na Guerra do Líbano de 2006 (NT).

(5) Serviço secreto de Israel (NT).

(6) Refere-se Sua Eminência à tática alemã, implantada durante a II Guerra Mundial, de ataques rápidos e fulminantes (NT).

(7) O Templo de Salomão, cuja destruição sempre foi prenúncio de grandes tragédias para os judeus (NT).

Extraído IBEI

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