sábado, 23 de agosto de 2008

O CASO MARCOS LOSEKANN

A nota publicada na coluna Contexto, do jornal Amazonas em Tempo, no último dia 20, sobre o episódio envolvendo o repórter da TV Globo, Marcos Losekann, mostra como certos veículos de comunicação e seus jornalistas estão longe de passar informações corretas para o público.

De forma simplista, sem questionamentos e sem ouvir o contraditório, a coluna, assinada pelo jornalista Mário Adolfo, comprou e reproduziu as alegações da TV Globo sobre o incidente, inclusive, o termo sequestro utilizado de forma maldosa pela emissora de televisão para descrever o caso.

Pior foi ver o jornalista reduzir o Hezbollah, maior partido libanês com amplo apoio popular e uma vasta participação na vida política e social do Líbano, responsável pela libertação das terras ocupadas e dos prisioneiros detidos em Israel, a um simples grupo "terrorista" que é patrocinado pelo Irã.

Além disso, elogiou o trabalho de Marcos Losekann quando este esteve por aqui, na região amazônica, como correspondente da TV Globo. Difamar o Amazonas e a Zona Franca de Manaus era o seu hobby preferido.

Agora o veneno do repórter Marcos Losekann se virou contra o Líbano, seu povo e sua resistência.


Por esse motivo, enviei carta ao jornalista Mário Adolfo onde faço algumas observações sobre o episódio. Confira!


Prezado jornalista Mário Adolfo.

Li a nota publicada, no dia 20/08, na coluna Contexto, do Amazonas em Tempo, que tratava do incidente envolvendo o repórter da TV Globo, Marcos Losekann, e o partido libanês Hezbollah, em Beirute, no último final de semana, e por conta disso, gostaria de fazer algumas observações e comentários.

Em primeiro lugar, quero deixar claro que não pretendo ser porta-voz ou defender o Hezbollah, mesmo porque não tenho autorização e nem o grupo precisa de mim para isso, mas sim para alertá-lo sobre certas circunstâncias ignoradas na abordagem desse assunto.

Como jornalista amazonense de origem libanesa, que já morou por muitos anos no Líbano, tendo, inclusive, colaborado com jornais daquele país, e que acompanha a vida política libanesa de perto, sendo dono de um blog que aborda também a política libanesa, a do Oriente Médio, a do mundo árabe e muçulmano, não posso ficar calado diante da nota que considero ofensiva ao povo libanês e sua resistência. Por este motivo, faço essas observações para ajudar nesse debate.

Creio eu que você Mário Adolfo, como jornalista de longa data de trabalho, sabe muito bem que o Líbano sofreu diversas invasões de seu território por parte dos israelenses, sendo a pior delas, a que ocorreu em 1982, quando as tropas israelenses conseguiram chegar na capital Beirute, dizimando dezenas de milhares de inocentes, incluindo, mulheres e crianças. Naquela ocasião, o governo e as forças armadas libanesas estavam fragmentados por conta da guerra civil iniciada em 1975, o que impediu que o exército pudesse, portanto, defender o povo libanês das agressões israelitas. Desta forma, não restou outra opção à população civil a não ser fazer a resistência por conta própria.

Vários grupos surgiram de todas as tendências (nacionalistas, socialistas, comunistas etc), contudo, eles não deram continuidade a luta contra a ocupação sionista. Porém, a partir de meados da década de 1980, surge a resistência do Hezbollah, formada principalmente, por pessoas comuns (agricultores, pedreiros, pintores, engenheiros, universitários, religiosos etc) que tiveram suas terras ocupadas, casas destruídas e familiares assassinados pelos israelenses.

Com o apoio de outros grupos políticos e de grande parte da população libanesa, essa resistência liderada pelo Hezbollah se fortaleceu a cada dia nos últimos anos, conseguindo em seguida libertar terras que estavam ocupadas há décadas e libertar vários presos libaneses detidos em cárceres israelenses. Quero lhe informar que terroristas não libertam terras e nem o ser humano. Portanto, é injusto e uma distorção você chamar e tentar minimizar a atuação do Hezbollah, reduzindo-o a um grupo terrorista.

O Hezbollah é um partido político legalizado, com vários deputados no parlamento libanês, com ministro no Governo de União Nacional formado recentemente, que implantou uma grande rede social que beneficia milhares de libaneses das classes mais necessitadas e que está encarregado de fazer a resistência porque o Líbano ainda se encontra em estado de guerra com Israel.


DAHIE

Fiz esse pequeno resumo do conflito, somente para poder te introduzir nessa questão sensível que é a região do Dahie, o local onde aconteceu o episódio com o Marcos Losekann.

Dahie (palavra que em português significa subúrbio) é uma área da capital Beirute formada por vários bairros e com uma população estimada em um milhão de pessoas. Pelo fato de fazer a resistência, a segurança de certas partes dessa área está sob o controle do Hezbollah, o que não é novidade para ninguém, pelo contrário, é de conhecimento de todo mundo que acompanha os acontecimentos no Líbano.

Qualquer um pode entrar nessas áreas para comprar, passear ou comer nos vários restaurantes do local que, por sinal, oferecem uma comida saborosa. Porém, por questões de segurança, para filmar, gravar ou tirar fotos é preciso ter autorização do Hezbollah.

Portanto, o Hezbollah não errou ao deter e interrogar o Marcos Losekann. Se o repórter da Globo não tinha autorização do Hezbollah, então não pode gravar no Dahie.


O Hezbollah tem autoridade sobre essa área que foi duramente bombardeada em 2006 pelos israelenses que destruíram mais de 230 prédios residenciais, deixando milhares de libaneses sem casa para morar (imagens do Google Earth mostram bem os estragos que os judeus fizeram nessa região). Além disso, essa área é alvo fácil de serviços de inteligência que enviam espiões, alguns deles, travestidos inclusive de jornalistas, para "visitar" o local com o intuito de obter informações sobre a resistência.


Não esqueça que Marcos Losekann, até pouco tempo atrás, era o correspondente da Globo em Israel, onde morou por muitos anos e fez uma cobertura pífia caracterizada pela parcialidade em favor do terrorismo sionista e pelas defesas apaixonadas dos massacres e dos genocídios que os israelenses praticaram contra os libaneses e os palestinos. Os civis inocentes mortos por Israel eram chamados por Marcos Losekan de "terroristas", enquanto que as agressões e a matança israelense eram classificadas por ele "de ações de defesa".


Não adianta o Marcos Losekann dizer que tinha autorização do Ministério das Relações Exteriores para trabalhar no Líbano, pois esta autorização só serve para o Dahie se tiver a autorização da resistência.

É como se um jornalista estrangeiro viesse para o Brasil e pegasse uma autorização para trabalhar aqui, mas não para entrar em uma área de segurança máxima.

Dessa forma condeno a postura de Marcos Losekann de querer posar de vítima. Marcos Losekann precisa respeitar as regras do Líbano, da mesma forma que jornalistas estrangeiros respeitam as regras do Brasil. A atitude do repórter da Globo foi suspeita.

Não concordo com o termo que a TV Globo usou ao descrever o episódio como seqüestro e que você e outros de forma simplista reproduziram. Não houve seqüestro. O Hezbollah estava dentro de seu limite de agir como responsável pela segurança do Dahie ao abordar Marcos Losekann e seu parceiro.


Até mesmo em shoppings centers, quando se prende alguém com movimento suspeito, a pessoa é detida e interrogada. Por que o Hezbollah não pode fazer o mesmo quando se trata de sua área? Só porque o repórter é da TV Globo?

INIMIGO DO LÍBANO

Vou ser sincero contigo como sou com todo mundo. Marcos Losekann é inimigo do Líbano e de seu povo. Ele não deveria nem ter colocado os pés dele no Líbano. Como já te expliquei acima, ele usou e abusou ao insultar os libaneses chamando de terroristas as crianças assassinadas por Israel. Uma ofensa sem fim, fruto de um comportamento cretino que não se perdoa.

O papel do jornalista é o de informar. Não de ficar arrumando encrenca para beneficiar os inimigos do Líbano e prejudicar a imagem desse país.


LIBERDADE DE IMPRENSA

Acompanho a trajetória do Hezbollah há muitos anos, incluindo a questão do relacionamento do partido com a impressa, e sei o quanto o grupo, que possui uma ampla rede de comunicação formado por televisão, rádio, internet e jornal, é a favor da liberdade de expressão. Vários veículos de comunicação internacionais, os ocidentais entre eles, mantêm contato direto com o Hezbollah, e entrevistam com freqüência seus políticos e militantes. O Hezbollah não está fechado para ninguém. Qualquer um pode ter acesso ao grupo, inclusive, você Mário Adolfo e o jornal Amazonas em Tempo, se quiserem. A própria TV Globo já fez várias matérias no Líbano e no Dahie, inclusive, com o secretário-geral do Hezbollah, Sayed Hassan Nasrallah.

Só para a tua informação, vários diplomatas ocidentais visitam os escritórios do Hezbollah para conversar sobre política no Líbano e no Oriente Médio com a legenda. Grupos de judeus (não israelenses), europeus e norte-americanos que visitam o Líbano para conhecer a realidade do país são recebidos com freqüência pelo Hezbollah.

Será que essas pessoas todas, incluindo os diplomatas ocidentais, são terroristas também porque estão se encontrando com o Hezbollah?

RESISTÊNCIA ATÉ A VITÓRIA

Não será um jornalista parcial e malicioso como Marcos Losekann que vai destruir a credibilidade de um grupo grandioso em seus atos em prol dos pobres e dos oprimidos como é o Hezbollah, que possui uma simpatia grande no Líbano (inclusive entre os cristãos, onde o Hezbollah têm aliados, como o general Michel Aoun, do Movimento Patriótico Livre, o maior partido cristão libanês), no mundo árabe, no mundo muçulmano e também para muitos ocidentais.

Para finalizar, qualquer um que lembre um pouco da passagem de Marcos Losekann como correspondente na região amazônica vai recordar que o repórter da Globo usou e abusou de fazer matérias contra os interesses do Amazonas, ofendendo inclusive a Zona Franca de Manaus, minimizando seus benefícios para o Estado. Portanto, não me surpreende o fato de Marcos Losekan querer denegrir a imagem dos libaneses e da resistência.

Espero que essas informações possam ser de utilidade para você. O bom jornalista deve ouvir sempre o contraditório antes de publicar opiniões apressadas e ofensivas à quem quer seja.

Espero também que a coluna Contexto e o jornal Amazonas em Tempo não se tornem um espaço de manipulação para denegrir o Líbano, seu povo e sua resistência legítima, vitoriosa e gloriosa feita contra o terrorismo israelense que, de forma injustificada, é tão protegido por diversos veículos de comunicação.

Recentemente um dos articulistas do Em Tempo chegou ao absurdo de comparar o nobre patriarca dos árabes e dos hebreus, o profeta Abrãao (que a paz esteja com ele), que era uma pessoa da paz e do amor, com um verme terrorista e assassino chamado Ben Gurion, responsável pelo massacre e a expulsão de milhares de árabes da Palestina.

Que a paz esteja convosco!

Grato pela atenção




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