terça-feira, 29 de janeiro de 2008

"QUEREMOS VIVER EM PAZ DA MESMA FORMA COMO O RESTO DO MUNDO"

O prefeito da cidade palestina de Bani Naim, Radwan Manasra, concedeu uma entrevista, esta semana, ao blog Leitura Franca. Na ocasião, ele falou sobre a visita a Manaus, de sua cidade Bani Naim e, é claro, sobre a questão palestina.

Confira abaixo a entrevista completa.





Gostaria que o senhor falasse um pouco de sua visita a Manaus?

Em primeiro lugar, vim visitar a comunidade palestina presente aqui em Manaus. Outro objetivo da minha visita, é encontrar com os líderes políticos locais para explicar em detalhes sobre a questão palestina e explicar alguns pontos desta realidade para que todos possam entender o que se passa na Palestina. Queremos mostrar como os efeitos da ocupação israelense levaram um povo que tinha tudo para ser moderno a viver em um atraso de séculos. Queremos mostrar in loco o sacrifício do povo palestino, uma vez que vários veículos de comunicação não mostram a realidade deste sofrimento. A causa palestina é uma causa mundial. O mundo inteiro está preocupado com que acontece lá. Queremos que os políticos daqui vão um dia à Palestina conhecer a realidade daquele povo diante da ocupação. Nos encontros que tive senti que o povo brasileiro apoia esta causa justa. A paz mundial depende da solução do problema da palestina e uma guerra mundial pode acontecer se este problema não for resolvido. Queremos paz para o mundo inteiro.

Como tem sido sua recepção e os encontros com as autoridades?

Encontramos com o prefeito de Manaus, Serafim Corrêa, e tivemos uma recepção bastante boa. Ele nos convidou e fomos com ele conhecer obras que estão sendo feitas na cidade. Durante o nosso encontro, propomos e conversamos também sobre a possibilidade de as cidades de Manaus e Bani Naim se tornarem irmãs.

Que tipo de benefício esta irmandade pode trazer para os dois povos?

Com esta irmandade poderemos alcançar várias conquistas para os dois lados, principalmente, com a troca de experiência. A comunidade palestina desempenha um papel importante na economia de Manaus e gostaríamos que Manaus pudesse ter uma participação maior no desenvolvimento e na construção da sociedade de Bani Naim seja na agricultura ou infra-estrutura, por exemplo, ou qualquer outro campo.

O senhor teve também um encontro com a reitoria da Universidade Estadual do Amazonas. Como a universidade pode ajudar os palestinos?

Conversaremos sobre a possibilidade de um intercâmbio em que bolsas de estudo serão oferecidas para os estudantes palestinos. Conversarmos e traduziremos as negociações em acordo. Nossa meta é buscar o oferecimento de 10 a 20 bolsas de estudos.

Pode falar um pouco da situação da cidade e da população de Bani Naim?

A situação em Bani Naim antes de 2000 era bem melhor do que é hoje. Atualmente, Bani Naim está isolada do mundo. Ninguém pode entrar na cidade a não ser por uma de suas entradas que está sob o controle israelense. Os soldados israelenses é quem decidem quem entra e quem sai da cidade. Temos quatro entradas. Uma destas entradas liga Bani Naim a cidade de Hebron em um percurso que leva cinco minutos. Hoje, por causa da ocupação e das barreiras israelenses temos que percorrer 28 quilômetros para chegar em Hebron . Às vezes, leva mais de uma hora para chegar a este lugar que se não tivesse a ocupação chegaríanos em cinco minutos. O cerco a nossa cidade tem causado prejuízos sociais, econômicos e em vários outros campos da vida dos palestinos. Esperamos que haja logo uma solução para superar esta crise e voltar a paz para todos. Queremos viver em paz como o resto do mundo.

Do que depende a economia de Bani Naim?

Dependia do comércio. Mas por causa do muro que Israel está construindo, as atividades comerciais ficaram prejudicadas. Temos várias fábricas de marmomaria. A economia depende também da agricultura, mas a falta de chuva tem prejudicado os agricultores palestinos. A seca é tão grande que às vezes falta água até para beber. A seca acaba se tornando mais uma dificuldade na vida do agricultor palestino. A cidade depende também da ajuda internacional. O desemprego é grande na cidade por causa da ocupação e o cerco israelense.

Como o senhor avalia a disputa política entre o Fatah, que é o seu partido, e o Hamas?

As divisões políticas entre os palestinos são frutos da política norte-americana e a dos israelenses para a região. Teve uma eleição cuja legitimidade foi reconhecida por todos, mas infelizmente os norte-americanos e os israelenses não respeitaram e não aceitaram este resultado porque eles vêem o Hamas como inimigos. Os Estados Unidos e Israel não corresponderam com os anseios do povo palestino e isto acabou criando uma situação psicológica grande nos palestinos e uma parte do povo começou a recusar estes resultados criando uma divisão no povo.

E como o senhor analisa os recentes acontecimentos em Gaza com o bloqueio israelense e os problemas na fronteira com o Egito?

Olhamos com tristeza para os acontecimentos em Gaza. Esperamos que esta situação seja resolvida o mais rápido possível. O que aconteceu na fronteira com o Egito foi normal porque o povo vai arrumar qualquer meio para furar o blqueio. Esperamos que os países vizinhos e o mundo todo entendam que o sofrimento do povo palestino chegou a tal ponto que eles foram obrigados a invadir a fronteira internacional. O povo palestino é civilizado e não tem nada haver com a imagem de bárbaros que a ocupação israelense tenta mostrar. Porém, a paciência do povo tem limite. As autoridades na Cisjordânia e na Faixa de Gaza precisam aproximar suas opiniões. É preciso proteger este povo.

O senhor acredita na paz com os israelenses?

Israel precisa ajudar na solução dos problemas na região, uma vez que os israelenses também são extremistas. Israel sabe que vai se prejudicar também se continuar esta situação. Se prejudicará porque se os palestinos não tiveram segurança, os israelenses também não vão ter segurança. Israel precisa garantir uma segurança mínima aos palestinos para que ela possa também ter o minímo de segurança. A verdade é que a situação dos palestinos está ligada a dos israelenses. Israel se prejudicará a medida que o povo palestino for prejudicado. Se os palestinos viveram em paz, a região toda também viverá em paz.

O papel desempenhado pelos governantes árabes tem sido no mínimo decepcionante para os povos da região. Na sua opinião, como o senhor vê a atuação destes governos para solucionar o problema da Palestina?

Apreciamos os esforços dos países árabes e olhamos com respeito a iniciativa destes países. Esperamos que eles estejam do nosso lado. A Palestina é uma extensão do mundo árabe. Todos eles são parte da causa palestina e esperamos que eles tenham uma participação maior nesta questão.

Há dois meses foi realizada em Annapolis, nos Estados Unidos, uma conferência para impulsionar o processo de paz, conforme a propaganda norte-americana. Porém, foi só as partes virarem as costas e as agressões israelenses aumentaram desde o início do ano para cá, não só em assassinatos, mas também com a expansão das colônias judaicas em território árabe. A Conferência de Annapolis fracassou na sua avaliação?

Nós palestinos sempre apoiamos e damos as boas vindas a qualquer porta que seja aberta para resolver a questão palestina com a condição que não tenhamos que abrir mão de direitos como a capital em Al-Quds (Jerusalém) e a volta dos refugiados as suas terras. O nosso objetivo é podermos viver lado a lado com os israelenses, nós com o nosso Estado, e eles com o Estado deles, com fronteiras delimitadas em que um povo vai preservar o direito do outro de ter um vida digna. A Conferência de Annapolis é mais uma porta da esperança que foi aberta. Esperamos que esta porta não seja fechada.

Mas o governo israelense que se comprometeu a buscar a paz, de Annapolis para cá, tomou várias medidas que dificultam a paz na região, entre elas, a de expandir a construção de casas para os sionistas nos territórios palestinos ocupados?

O comportamento israelense não mudou antes, nem agora e nem mudará no futuro. Porém, esperamos que haja pressões e garantias internacionais para que Israel aceite uma solução.

Neste curto período que o senhor passou aqui, qual foi a impressão que ficou sobre o povo amazonense e o Amazonas?

Simplesmente, até agora, não senti que sai de Bani Naim. Me sinto em casa aqui. O povo amazonense é humilde, hospitaleiro e muito bom. É um povo que ajuda as pessoas. Aprecio o povo amazonense que é um povo muito moderno.

Um comentário:

Anônimo disse...

Anwar, parabéns pela entrevista! Vou procurar sempre acompanhar teu blog! Toda a sorte do mundo! O meu é o jaraqui com malagueta e esse ano espero postar mais! Grande abraço e mais uma vez, parabéns pela entrevista! Que a paz esteja presente não só na Palestina, mas em todo o mundo!!